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Apoena, brasileiro inserido na indústria do vinil, nos conta sobre suas inspirações, vida e carreira

março 07, 2016portalundergroundbrasil@gmail.com


Entrevistamos Henrique Casanova, conhecido pelo seu projeto Apoena. Ele é um dos poucos brasileiros inseridos na indústria do vinil, e tem reconhecimento internacional por seus lançamentos. No Techno, tem discos na gravadora inglesa Autoreply/Stuga, que abriga produtores como Dan Curtin, OCH e Ed Davenport. No Deep House, adentrou em lables como Underground Quality, gravadora norte-americana com fans no mundo todo e que já lançou artistas do porte de Levon Vincent, Steffi, DJ Jus Ed e Anton Zap. Tem ainda trabalhos em vinil em labels vanguarda do underground como a alemã Rawax e a ucraniana MRS.

Confira a entrevista que Apoena deu exclusivamente para nós do Portal Underground, onde ele conta sobre como a música influenciou toda a sua vida, sobre suas origens e carreira, projeções, e muito mais. E nada melhor do que curtir a entrevista ouvindo um set que ele gravou especialmente para a festa Electric Monday, que ocorre no Kitkat Club em Berlim.



Qual a origem do nome Apoena?

Lá por 2005 eu resolvi fazer uma conta no MySpace, que era tipo o SoundCloud da época. Era a primeira vez que eu mostrava minha música publicamente. Resolvi que queria usar uma palavra indígena como nome artístico. Peguei um dicionário Tupi-Portoguês e li inteiro. Gostei do som da palavra Apoena. O significado dizia "aquele que enxerga longe".

Fale um pouco sobre como foi o início da sua carreira, incluindo os aspectos: O que te levou a querer ser DJ?

Sou bastante musical. Todos os estilos de música que eu já gostei, acabei me interessando também por tocar e compor. Quando adolescente escutava Metal e comecei a tocar violão e guitarra. Depois com reggae também me meti a cantar, tocar baixo e bateria. Samba de raiz, outro estilo que gosto, tenho algumas músicas compostas. Na música eletrônica foi a mesma coisa. Não demorou pra eu perceber como se tocava, o que o DJ fazia, e querer fazer também. Comecei a comprar discos e mixar na casa de DJs. Ao mesmo tempo descobri o software Rebirth, que emulava equipamentos de música eletrônica, e comecei a mexer. Isso foi entre 1999 e 2000. Logo depois fiz um curso de DJs, ministrado por Fabrício Peçanha e Mozart Riggi.

Como foram as primeiras festas que tocou?

Minhas primeiras gigs foram proporcionadas pela festa Fusion e também pelo antigo núcleo Re:existência. Sem esquecer de festas mais caseiras que o pessoal do Canal #Techno (mIRC) fazia. Com o passar de poucos anos tive oportunidade de tocar em várias das casas que abriam espaço ao techno, como Ibiza Club (em ambas as sedes, Atlântida e Gramado), Fim de Século Club, Ocidente, W Pub etc.


Como foi o seu primeiro contato com a música eletrônica?

A primeira coisa que realmente me chamou atenção foi um álbum do Prodigy, não tenho certeza do ano. Comprei o CD e depois foi só descobrir onde tocava esse tipo de música. Não demorei a descobrir o Fim de Século club em POA e o Ibiza club no litotal. Os DJs que me fizeram conhecer a música eletrônica foram Eduardo Herrera, que eu via na pista UK do Ibiza, depois os DJs Double S e Fabrício Peçanha, que eu via no Fim de Século. Depois conheci a festa Fusion e comecei a escutar um som ainda mais underground que era tocado pelos residentes, que até hoje tenho como bons amigos.

Como nasceu o amor pela música? 

A primeira coisa que eu lembro de escutar bem encarnado foi uma fita k7 do Dante Ledesma, que meu pai tinha. É um álbum lançado no meu ano de nascimento, 1980. Não sei com que idade eu escutava isso mas eu era bem criança. Lembro da seriedade do som, que combina muito com tudo que eu passei a gostar de música depois disso. Lembro inclusive que eu fingia tocar violão enquanto escutava. Claro que eu não sabia tocar violão naquela época, mas já combinava a coordenação motora com a estrutura musical.

O que a música significa para você?

Eu não sei dizer o que significa. É um canal de expressão de emoções. E é também uma forma de viver, é quase uma visão de mundo. Eu passei a vida inteira escutando e fazendo música. Ela é parte de como eu vejo o mundo e também de como eu vivo nele.

Qual é o estilo musical que você mais escuta por prazer?

Sou ao mesmo tempo eclético e específico. Porque gosto de estilos que são diferentes entre si, mas gosto só de alguns e de alguns poucos artistas que sou encarnado. Escuto música eletrônica e Reggae com mais frequência, mas tenho nomes como James Taylor (folk americano), Joni Mitchell (folk/jazz canadense) e Mercedes Sosa (música latina argentina) como grandes ídolos. As vezes mergulho em um desses três e escuto por meses. Não escuto nada que toca na mídia. Tudo que mais gosto encontrei sei lá como. Não conheço nem por nome as coisas que tocam no radio ou na TV.


E para compôr os seus sets, qual é o estilo musical que você prefere?

Sou DJ da transição entre House e Techno. Comecei a tocar com hard techno e sou produtor de deep house. Isso faz com que minha área de interesse e experiência seja ampla, mas a característica que eu procuro é sempre a mesma. Gosto da pegada oldschool que está vida até hoje na indústria do vinil. Timbragens clássicas que escuto desde o Chicago house, desde o Detroit Techno, desde o Dub Techno alemão, desde o Hard Techno inglês.

Conte para nós sobre suas turnês pela Europa e sobre a residência em um club de Berlim?

Fui escalado pelo DJ Jus Ed pra tocar no Underground Quality Festival, em Berlin, Agosto de 2015. A UQ é dos mais importantes selos do deep house em vinil e é uma das gravadoras nas quais já lancei discos. Foi minha primeira ida a Europa e foi ótimo. Não tem muito como explicar. A pessoa que nunca esteve lá só vai saber como é a cena de lá quando for e ver por si mesmo. Conheci pessoas e acabei tocando em outras festas menores. Toquei também na ilha de Rhodes, na Grécia, naquela mesma trip. Pechei bastante gente entre DJs e produtores. Dei meus discos a algumas pessoas e isso teve bons frutos. Acabei fechando novas gigs pros meses seguintes e em Dezembro estava lá de novo, tocando no Kit Kat, Ipse e Golden Gate. Esse último é visto por muitos berliners como um Club muito especial. Underground de verdade, pouco turista, longe do hype dos Clubs conhecidos. As pessoas que eu conhecia lá ficavam bem impressionadas quando sabiam dessa gig no Golden Gate. Eu só entendi quando o dia chegou e fui tocar. O pico é realmente o "real deal". Mas a gig que mais gostei foi no Kitkat. Meu som combinou muito com a festa e tive uma das experiências mais intensas de envolvimento com a pista, de vibe, de tudo. No fim da noite o booker me disse que eu teria 3 noites por ano lá. Fiquei muito feliz mas disse pra ele que eu não conseguiria ir tanto pra Europa, mas eu aceitava uma gig anual. Ele me mandou escolher meu mês e trato feito.

Qual foi o melhor momento da sua carreira? Por que?

Essa é fácil, mas não é um momento só. Sempre que consegui me soltar tocando a ponto de me divertir com o desafio técnico de mixar, envolvendo bastante as pessoas, fazendo a pista esquentar e ficar na mesma vibe que eu. Esses são os momentos mais especiais e graças a Deus, já aconteceram bastante. Esse dia no Kitkat Club foi assim, mas também aconteceu em outros sets. Além disso, cada disco novo que eu vejo chegar nas lojas também é algo muito especial. Ver a materialização dum sonho antigo e que um dia era muito distante.

Qual a origem do seu selo? E qual a motivação de produzir em vinil?

Ter o próprio selo é a evolução natural dum produtor ativo como eu, que tem uma penca de tracks não lançadas. O nome é o nick que eu usava no mIRC, aquele sistema de chat antigo. Eu entrava na sala #Techno com o nick <AllnightDancer>, que depois virou <allnite---->. Daí o nome Allnite Music (música do allnite hehe).
Sobre o vinil, imagina um cara que sonha em ser um grande tenista. Ele adora tudo que envolve o tennis. Sonha com as quadras, com as jogadas, com as técnicas, com os campeonatos importantes. Dai um dia o mercado decide que tennis dá muito trabalho e se foca no ping pong. Duma hora pra outra todos jogam só ping pong e só passa ping pong na TV. A paixão daquele cara pelo tennis não vai mudar por causa disso. Comigo é a mesma coisa. Os DJs pararam de usar disco, os selos pararam de lançar em vinil, mas isso não é problema meu. Meu sonho foi sempre lançar discos e tocar discos. Essa paixão não vai morrer só por que todo mundo esqueceu o vinil. Pra mim o vinil é parte inseparável de ser um DJ e Produtor.


Sobre seus ídolos e inspirações: Você se espelha em algum DJ?

Não me espelho porque acabei desenvolvendo uma visão sobre ser DJ que é bem minha. Tenho meus DJs favoritos, é claro, mas não tento ser como eles. Somos diferentes. Sigo conceitos e princípios que surgiram em mim mesmo. Me avalio e tento evoluir segundo meu próprio crivo.

Qual é o seu DJ preferido?

Impossível citar um DJ preferido, mas os que mais gosto de ouvir são ilustres desconhecidos. Volta e meia descubro algum carinha perdido no Soundcloud, que quase não toca, e que grava um Set que eu acho animal. Tem muita gente boa aqui no Brasil mesmo. Lá na Grécia, que é um país pobre da Europa, vi DJs incríveis. Galera boa de mix tocando por várias horas, por quase nada de cachê. Pra citar nomes conhecidos digo DJ MauMau no Brasil, que vai ter meu respeito pra sempre. Mixador cada vez melhor, gosta do que faz, não tem preguiça de trabalhar pitch até hoje (vinil e CD), levanta as pistas sempre, sem nunca cair em mau gosto. O cara é foda! E internacionalmente vou citar Ben Sims, simplesmente o maior nome do techno mundial na minha opinião. E de quebra mixa demais, sabendo usar groove no techno. 

Quando/como você começou a produzir? 

Comecei ao mesmo tempo a tocar e produzir. Primeiro usava o software Rebirth, que emulava muito bem equipamentos clássicos como a 303, 808 e 909, mas era limitadíssimo. Depois migrei pro software Reason, do mesmo fabricante, e uso ele até hoje, juntamente com Logic. Produzir e compor é algo muito natural pra mim. Não é um esforço, é quase uma teimosia. É algo que eu não consigo não fazer.

Sobre as tracks que você já produziu, qual é a sua inspiração?

Minha inspiração pra produção deu um BOOM quando eu conheci o Detroit Techno. Dentre todos os selos e escolas, foi a vibe da Transmat/Fragile (os selos do Derrick May) que mais me influenciaram. As tracks do próprio Derrick May na Transmat e as tracks do jovem que ele ajudava a surgir na Fragile (Carl Craig, ainda sob pseudônimos), me mostraram o poder sugestivo das harmonias e melodias menores em música eletrônica. É um som existencialista, pra dizer o mínimo. Recomendo colocar a track "Rythm is Rythm - Icon" nesse ponto da entrevista pra ilustrar.


Depois o Chicago House tbm me influenciou muito. Glenn Underground é o nome que mais me marca no Deep House. É o único produtor do planeta que tu pode deixar o Youtube rolando as tracks automaticamente e tu nunca vai precisar ir lá passar a track. Pra mim, o cara é dos grandes gênios da música. 

Quais suas tracks foram tocadas por quais DJs de peso? Como você se sentiu quando descobriu que suas tracks haviam sido tocadas por eles?

Meu primeiro disco foi tocado por Delano Smith e Luke Hess, ambos ídolos meus de Detroit. A track se chama Nuvem. Outros nomes, inclusive maiores, estão nessa lista mas esses dois foram os mais emocionantes pra mim, por que eu gosto muito do som deles, independente do tamanho do nome deles. Pra mim foi como um carimbo de aprovação da minha produção. Dá uma satisfação muito grande por que posso me sentir um deles. É isso que sempre quis na real. Botar discos nas prateleiras que nem meus produtores preferidos e o som ser bom. Ser mais um dos caras. Se o Delano Smith tocou; missão cumprida.

Quais são suas projeções para o futuro?

Difícil projetar. Primeiro quero conseguir sempre não desistir e não desanimar com as dificuldades. Depois é seguir desenvolvendo o sonho. Fazer mais tracks que eu goste, lançar mais discos, tocar em mais gigs, que é algo que me dá muito prazer, e bola pra frente.

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